Musa não és

Musa não és!
Perecíveis são as musas,
Envelhecem e perdem energia.
E tu,
Continuas a acordar-me o dia,
A preencher-me a alma,
A agitar-me o coração,
A empurrar-me a mão
Para o papel
E a desenhar através de mim
As palavras do génesis
E do fim.
Trago o teu olhar brilhando no meu,
Trago o teu sorriso no meu rosto,
Trago no meu peito teu gesto terno.
És meu calor de Agosto,
Minha chuva de Inverno,
Meu vento na vidraça,
Uvas entre os dedos,
Saudável epidemia que não passa,
Exorcista de meus medos.

Não sei se vivo em ti,
Não sei em que medida.
Sei que me invadiu o ser
Uma absurda vontade de vida.
Respira e viverei,
Caminha e andarei,
Mas não me toques
Que ao tocar-me
Abres um abismo fundo,
Um descontrolo total,
Um fim de mundo,
Um querer absurdo,
Uma voracidade
E uma posse.
Um delírio de desejo
Que se materializa
No próximo beijo
Por dar!
E toca-me,
Mostra-me a minha finitude,
Ensina-me que se chama completude
Ao esbater das fronteiras
Do meu corpo no teu.

Não sei o que és.
Sei que musa não és.
De ti não me vem só a inspiração.
Vem-me a vontade, a ilusão,
O desejo, a harmonia,
O começo
E o fim do dia.
E vivo suspenso de ti.
Adiado.
Até que o eco dos teus gestos
Acalme o palpitar deste peito
Docemente subjugado.

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