Sinal...

Ontem fiz a viagem de comboio com o Carlos. O Carlos, a quem dedicarei um texto lá mais para frente e com outro cuidado porque me exige mais atenção e substância, é uma daquelas pessoas com quem se pode ter uma conversa deliciosa e dinâmica que começa na análise do porquê que um tipo não me quis trocar uma nota de dez euros e acaba a gisarmos o futuro do universo e a compreendermos a acção dos nossos filhos nele. Tínhamos a lenga-lenga atrasada pelo menos quinze anos. Por isso, ontem, foi só um cheirinho.
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A determinada altura ele perguntava-me o que é que me impelia a escrever e eu dizia que qualquer coisa até porque eu era o tipo de pessoa observadora, que absorvia tudo e disse-lhe, Está atrás de ti uma mulher bonita com umas olheiras enormes e o mais certo é vir a escrever sobre isso.
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Pois cá estou. E a escrita será breve. Era jovem e bonita. Harmoniosa nas formas. Tinha ternura na expressão. Mas não só. Estava cansada e derrotada e, ainda o dia se anunciava e a alvorada se espraiava para além das janelas do comboio, já ela estava em fim de jornada. Não sei o que andamos a fazer, mas estamos a construir uma geração de derrotados, de cansados, de pessoas que não acabam o dia anterior nem iniciam o novo.
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Quando se anuncia um novo dia, gosto de preparar-me para tudo o que vai trazer-me, para todas as riquezas e acredito sempre que vai surpreender-me. Preparamo-me para rir e chorar, para o prazer e para a dor, para os sucessos e os insucesos. Para aprender. E preparo-me sempre para viver. As olheiras da mulher de olhar azul e triste, cabelo loiro e cansado, deixaram-me a pensar. Sabia que seriam um sinal. Quis dizer ao Carlos de quê, mas não fui capaz. Hoje já sou. Aquilo foi um alerta. Não sei como estarei amanhã, nem daqui a cinco anos, se cá estiver, mas fiquei a saber que não quero estar assim. E se me acontecer estar, será altura de mudar. Outra vez!

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