O Clã do Comboio - Mudança

Mudança

Da Mudança
Esta minha ideia de viajar às 7:47 em vez de às 7:05 traz-me uma dor. A ausência do meu Clã. Acho que nunca o senti tão meu como agora. Nem sequer, NUNCA, nas 100 histórias que escrevi sobre ele, o tinha chamado de meu. Faço-o agora porque aquela rede de partilhas tem uma força própria, mas essa força própria começou em mim e com os meus textos. Eu sou responsável por isso. Há quinze meses atrás, estas pessoas, estes meus preciosos amigos, não se conheciam, não se falavam, não tinham a teia de interações que têm hoje, não iam almoçar juntos, não empreendiam aventuras como a dos coiratos ou a da ginginha, não faziam pequenos-almoços nem festas a bordo para cantar os parabéns. E hoje, felizmente, fazem tudo isso. Em breve lhes dedicarei algumas linhas neste mesmo espaço.

Acontece que a vida evolui como organismo vivo e em constante mutação que é. E eu estou a descansar mais, a dormir mais e a viver as manhãs da minha existência com menos violência. Em vez de apanhar o interregional das 7:05 em Entroncamento, apanho o regional das 7:47 em Riachos. Apanho o comboio com o breu vencido pelo sol glorioso e pagarei menos. Já para não dizer que em Riachos tenho estacionamento gratuito à porta da estação. Menos despesa, mais tempo. As minhas manhãs começavam às 5:30. Agora podem começar às 6:45.

Feliz Coincidência
No entanto, e apesar das coisas bonitas que ficam para trás, a vida surpreende-nos sempre com novas realizações. Ontem, por uma feliz coincidência, na viagem de regresso, encontrei vários elementos do Clã. E foi fantástico. Vieram comigo, a Senhora da Revista de Culinária, a Rapariga com Brinco de Pérola, a Senhora das Tripas à Moda do Porto e o Rapaz do Fato Cinzento. A Senhora da Revista de Culinária tinha trazido um bolo e resolveu partilhá-lo connosco. E lá fomos os cinco sentados em quatro lugares, escrevendo textos, contando anedotas, comendo bolo, sacudindo a farinha, matando saudades. É bonita, a vida. Pode mudar, mas há amigos e amizades que ficam para sempre. A ver vamos se aguento esta mudança.



Riachos

A mente humana é muito complicada. Mesmo muito. E, às vezes, desnecessariamente. Há uma estação de comboio que se chama Riachos/Torres Novas/Golegã mas que, efetivamente, fica em Riachos. Claro que os homens entenderam que, sendo Torres Novas o município de que Riachos é freguesia e sendo a Golegã um município, não podiam aquelas duas edilidades deixar de estar representadas no nome da estação. Claro que o argumento foi ter a estação o nome das localidades que serve. Pura hipocrisia. Senão vejamos, tivesse a estação de Entroncamento o nome de todos os municípios limítrofes que serve, incluindo os dois que constam do nome da que estamos agora a comentar, e precisaríamos de uma placa com 50 metros de comprimento para registar tanto nome. Pois eu, que nem sequer sou de Riachos, nem lá moro, não me importo nada de dizer que hoje apanhei o comboio em Riachos. E foi bonito. E por isso estas linhas.


Eram 7:42. Faltavam cinco minutos para o comboio chegar. No interior da estação, um relógio antigo de madeira com um mostrador de números romanos a reluzir reflexos. Lá fora o sol desponta no edifício tradicional, antigo mas reparado, da estação. Há palmeiras no horizonte e nas minhas costas, uma inusitada sinfonia de passarinhos canta a manhã. É a melodia do acordar. Há terrenos com oliveiras frias e o chão é um manto branco de geada onde brincam coelhos selvagens em correrias loucas de aquecer, em disputas que só eles percebem. Lisboa é já ali, mas esta ruralidade agrada-me. A minha alma mora aqui.

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