Histórias do Autocarro 28 - Quiiiiinze

Quiiiiinze


Paragem do Autocarro 28. Estamos à espera e somos muitos. Uma fila de proporções intermináveis. Ao meu lado uma senhora baixinha, loirita, cabelo liso e pelo ombro, calças de ganga e blusa de algodão rosa. 

E eis que eles chegam. Dois idosos. Daqueles alemães com o cabelo já branco, com pernas que começam no chão e terminam sabe-se lá onde, sandálias com meias, calções e a inevitável mochila às costas.

Não diziam uma palavra de português e falavam um inglês muito fraquinho. Qualquer aluno meu do ensino básico é mais fluente. A loirita, por sua vez, não dizia uma palavra de inglês e de alemão, então, é que nem deve saber que existe.

Conversa.
Começam eles, dirigindo-se para a senhora. Dobram-se como se fosse preciso encurtar distâncias para ela os conseguir ouvir:

- Please, to... Algés...

Claro que, para perceber que tinham dito "Algés", foi precisa muita imaginação. Ainda assim, a senhora respondeu em português para alemães. E o que é isso? É português como todos nós falamos mas dito muito alto, muito lentamente e com a boca muito aberta. Ou seja, neste momento, temos dois gigantes alemães curvados sobre uma anã portuguesa que abre muito a boca, fala muito alto e diz:

- Quiiiiinzeeee... tem de aaapanhaaar o quiiiiinzeeee...
- What? Algés?
- Ai, valha-me Deus, o quiiiiinze... para Algés tem de aaapanhaaar o quiiiiinze...

E virou-se para a estrada à espera do autocarro. Os alemães voltaram a endireitar-se e a colocar a cabeça nas alturas e, claro, começaram a falar alemão. Consegui perceber que diziam que não tinham percebido nada e o melhor era verem o mapa.

Eu acho que é de uma incompetência atroz não conseguir decifrar uma palavra dita com tanta precisão, tanto cuidado e tanta hospitalidade. Afinal de contas quem é que não percebe quinze quando é tão bem traduzido para quiiiiinze?!

jpv

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