Crónicas de África - Sem Preconceitos


Crónicas de África - Sem Preconceitos

Maputo, 30 de janeiro de 2013

Hoje, vou falar-vos de um assunto sensível. Acho mesmo que a maioria das pessoas em Maputo, portuguesas e moçambicanas, evita falar sobre ele. Percebo que seja sensível porque mexe com as emoções das pessoas. E com os conceitos. Ora, onde estão conceitos, normalmente, estão também preconceitos. Acontece que tenho sobre o assunto uma visão terna e conciliadora e, mesmo que não tivesse, prometi escrever nas "Crónicas de África" (ver 1ª crónica) sobre tudo o que visse, ouvisse e sentisse.

Moçambique e Portugal são duas grandes nações com uma história construída em comum, com momentos maus e momentos bons, como em todas as relações, mas com uma inexorável consequência: moçambicanos e portugueses há muito que sabem relacionar-se, há muito que se conhecem, há muito que contam uns com os outros e há muito que... se casam!

E arrisco dizer, sem grande margem de erro, que a segunda nacionalidade com que os moçambicanos mais casam é a portuguesa, depois dos próprios moçambicanos, como é natural. Também arrisco que uma grande parte dos portugueses emigrados em Moçambique casa com moçambicanos. Às vezes, à custa do fim de relacionamentos que já existiam e encontram o seu termo por essa razão. É preciso respeitar a dor e o sofrimento dos envolvidos nesses momentos de rutura, mas é igualmente preciso reconhecer, sem preconceitos, que as pessoas mudam e, por vezes, terminam relacionamentos para iniciar outros sendo isso um direito que lhes assiste.

Ora, veio todo este introito a propósito de algo que observo com frequência e que faz parte da abertura e da multiculturalidade da sociedade maputense. Há muitos casais compostos por homens portugueses de idade visível e incontestavelmente superior às mulheres moçambicanas com que resolvem juntar os trapinhos. Não sei, nem me interessa, se casam, ficam em cohabitação, são amigos, companheiros ou outra coisa qualquer. Interessa-me que fazem parte da paisagem e do quotidiano desta cidade. Vemo-los às compras nos supermercados, vemo-los a tomar o pequeno-almoço ao fim de semana pelas pastelarias disponíveis, vemo-los a almoçar ou a jantar nos restaurantes, vemo-los lado a lado dentro dos automóveis, vemo-los a passear pelos jardins e pelas ruas da cidade. Normalmente, transpiram harmonia e bem estar. São homens que nunca casaram, que enviuvaram, que se divorciaram ou que por qualquer outra razão vieram a ficar sozinhos e procuram o conforto e o apoio de uma companheira na juventude de moçambicanas mais novas que sabem percebê-los e preencher o vazio das suas vidas. Olhando para este fenómeno de forma preconceituosa, podemos fazer juízos de valor terríveis, desde a diferença etária, às razões que levaram a tal união. Acontece, caros amigos, que os preconceitos não são bons conselheiros. E a vida torna-se bastante mais honesta e repleta de lisura se olharmos para ela de forma despreconceituosa. E a verdade é esta, nunca nenhum elemento destes casais me pareceu contrariado, e nunca nenhum me pareceu tão jovem e inocente que não soubesse no que estava a meter-se e porquê. E é aqui que eu quero chegar: se as pessoas conheciam os contornos da situação e sabiam no que estavam a meter-se, o resto, o que fica, para mim, para o meu eterno e amanteigado coração de romântico sem emenda, é a experiência casada com a juventude. A perfeita aliança, impossível de alcançar num mesmo corpo por inultrapassável problema da condição humana, vá-se lá saber como é que o Criador não reparou nisso, pode ser alcançada por esta união. Saibam e queiram eles, os elementos destes casais, encontrar a disponibilidade para aprender. Até lá, é vê-los por Maputo, passeando a sua felicidade. Onde ela vai dar, não é problema nosso.
jpv

NetWorkedBlogs