A palavra dada

[Em Itália, o Ministro da Justiça, Roberto Castelli, tenta impedir as investigações judiciais a alegadas fraudes fiscais no grupo mediático Mediaset, do primeiro ministro, Silvio Berlusconi, argumentando que o caso caía sob a alçada da lei de imunidade, recentemente aprovada (de certo modo "ad casum"). Não só a oposição, mas inclusivamente parceiros da coligação, como os democratas cristãos, reagiram duramente contra esta pretensão. O Vaticano anuncia que pretende fazer do acto de beatificação de Madre Teresa de Calcutá, em 19 de Outubro próximo, um "acontecimento televisivo de repercussão mundial". A TVE - Televisão Espanhola - é condenada por ter violado os direitos fundamentais da greve e da liberdade sindical. Esta situação surgiu na sequência da denúncia do sindicato Comisiones Obreras ter denunciado a TVE de manipulação informativa nos “Telediários” do dia 20 de Junho de 2002, dia de greve geral em Espanha. A Direcção do PS diz existir contra este partido uma cabala.

[Data da primeira publicação: 11 de Julho de 2003]

A Palavra Dada
Lembras-te, mana, dos natais em casa do avô Velez em Odivelas?
Lembras-te do alarido dos primos em correrias e risos de celebração de estarmos juntos?
Por essa altura, a avó fazia bolo-rei, torta de chocolate e moldava os seus cozinhados com a dedicação de quem ama, o carinho de quem dá e só quer em troca o sorriso de um neto. A sua figura pequena e a voz macia enchiam a cozinha e quando vinha à sala era para presenciar, com glória, a sua vitória. A vitória de ter as filhas à sua volta, os genros com elas e os netos a desarrumarem-lhe a casa de felicidade.

O avô, esse, como é seu timbre, falava alto, gesticulava, contava histórias de Áfricas antigas e trazia para a conversa todos os que o rodeavam. Era o exercício da memória; era o afanoso relembrar de sermos um clã em torno de si, para si.
Por vezes, as conversas ganhavam o entusiasmo dos argumentos esgrimidos com palavras. O avô, o pai, os tios, até a pequenada, todos opinavam e quem ganhava as batalhas aquecidas pelos petiscos e pelos vinhos da alegria era sempre a palavra dada!

Por alguma razão, as grandes questões eram sempre resolvidas em nome da honra, eram sempre assacadas as responsabilidades à palavra dada.
Lembro-me de pensar, um dia, que falar era como agir: uma palavra, um acto, uma consequência.

Entretanto, crescemos, cresceu o mundo à nossa volta, cresceram as explicações pedidas, multiplicaram-se os pedidos de provas. Apareceram no nosso quotidiano televisivo os tribunais, as testemunhas, as contratestemunhas e Dizer já não vale nada.
Que saudades tenho do eco das vozes numa mesa de família, da segurança de poder confiar numa afirmação só porque foi proferida.

É pena, mana, que a honra que brotava das palavras do avô e do pai não se veja já, nem escrita, nos papéis assinados e reconhecidos no notário.

Um beijo.
Mano

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