Da impunidade


Anda por aí uma expressão popular que vai dizendo "A justiça é cega mas a injustiça vê-se". A expressão percebe-se, embora esteja incorrectamente formulada. A mim, há algo que me preocupa e impressiona mais do que a injustiça e que também resulta nela: a impunidade.

Nos dias que vivemos, nem os gestos, nem as palavras têm o mesmo valor de outros tempos. Estão banalizados ambos. Um levantar de dedo podia despertar lágrimas e uma expressão como "senta-te" tinha efeito. Isto passava-se entre miúdos, entre adultos e miúdos e, claro, entre adultos. Se uma pessoa insultar outra, nos dias que correm, chamando-lhe, por exemplo, desonesta, covarde, estúpida, parva, ladra ou o que quer que seja que lhe venha à cabeça, o mais certo é não passar-se nada. Nem nada daí advir. E já não vai sendo raro que tenha o insultado de desculpar-se por ter provocado a reacção do insultador! O mais longe a que se chega, depois de consultados muitos intervenientes e várias instâncias jurídicas é a um pedido de desculpas que, claro está, pode desculpar o insultador mas já não apaga o gesto. E isto acontece nas famílias, entre amigos, entre colegas de profissão, entre desconhecidos, fundamentadamente justificando-se o injustificável: é que cedência a cedência, permissão a permissão, banaliza-se esta violência verbal entre pares, torna-se uma rotina nas rotinas e emerge o que de pior há no ser humano. A sua baixeza. A sua indignidade. O carácter ignóbil de actos que devia reprimir em abono da convivência com os seus semelhantes. E, está provado, isto cresce. E a impunidade é terreno fértil para o seu crescimento. Há uma frase interessante que diz "Basta que os homens de bem nada façam para que o mal triunfe". Pois acho que está na altura de os homens e as mulheres de bem fazerem alguma coisa.

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