"Com Amor," - Documento 15


Desculpa, Rui, se te magoei ou ofendi. Em todo o caso temos aqui um problema. Tu disseste que eu era tua amiga. Ora, os amigos dizem o que pensam uns aos outros. Eu sinto que Deus é uma fraude porque fui sempre abandonada por ele. Nunca me sobreveio. Até pelos filhos, Rui, até por eles tive de lutar. Lamento que possa magoar-te, mas se eu não posso escrever-te o que sinto e penso, então que sentido faz continuarmos a conversar?
Vivi dificuldades em pequena, Rui. Talvez todos as tenhamos vivido. As minhas foram agravadas pelo temor a Deus. Pelo medo constante do castigo, por decorar orações cujo significado desconhecia, por praticar rituais de obrigação, por ser tocada, ainda menina, pelas mãos do padre sabujo e ter de calar porque ele era Deus e eu seria uma mentirosa se pensasse revelar o que quer que fosse. E, mesmo assim, Rui, procurei-o. Fui ao seu encontro, refugiei-me na Sua palavra. Rezei. Casei-me segundo as Suas regras e depois, Rui, foi em Seu nome que tive de calar a violência de que era vítima. Era eu ou Deus e durante muito tempo foi Deus. Até que a mulher em mim, a dignidade que restava, resolveu erguer-se. E quando me ergui, Rui, foi em nome de Deus que deixaram de falar-me, que a minha própria família me virou as costas e me negou apoio. Eu tinha crianças para alimentar, Rui.
Esse Deus que tu vês só existe nos desenhos animados da Walt Disney!
Fui eu que venci, Rui. E tive de vencer Deus na terra. E sofrer.
Verónica

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